Nota de Desagravo à "Carta perplexa aos católicos"

Aos fiéis da Igreja do Habbo Hotel, aos homens e mulheres de reta consciência, e a todos quantos prezam a justiça e a caridade, paz e bem.

Com zelo pastoral e espírito profundamente ferido, nós, filhos da Igreja e servos do Evangelho, viemos por meio desta carta de desagravo declarar publicamente nossa indignação e repúdio às palavras abjetas que, sob o disfarce de sátira, foram proferidas contra a honra de clérigos consagrados, contra leigos em comunidade de fé, contra a dignidade humana, e contra a santa memória de uma comunhão eclesial construída com suor, lágrimas e fidelidade.

Foi divulgado um texto infame, intitulado de "carta de perplexidade", direcionada à comunidade eclesial de Belém do Pará, cuja natureza satírica e homofóbica agride não apenas pessoas concretas, mas o próprio espírito do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo. Aqueles que, com malícia premeditada e rancor profundo, outrora anatematizados, deram forma à zombaria e ao escárnio abjetamente declarado. Não ferem apenas aqueles que nomeiam, mas escarnecem daquilo que se fecunda no seio da Igreja pastoral em constante peregrinação. Esta difamação fere a dignidade eclesial, no vínculo da comunhão fraterna e na honra dos filhos de Deus: “Vós sois daqueles que lavam o exterior do copo, mas por dentro estais cheios de rapina e maldade” (Lc 11,39).

A virulência do discurso, travestida de “nota de perplexidade”, é antes um documento de ruína moral. Nenhuma sátira que se pretenda legítima nasce da humilhação alheia, da homofobia grosseira, nem do desejo de destruir pessoas e comunidades por motivos pessoais e ressentimentos históricos. Não somente, carece-nos lembrar da hipocrisia pessoal dos malditos redatores de tal panfleto, que tendo outrora vivido a mesma prática sem cessar, zombam como se portassem fé infalível e debocham com espírito de pura maledicência e orgulho. A linguagem da mentira, da chacota ofensiva e da violência de identidade não é linguagem cristã, é antes estalida como a língua da serpente, “mentirosa desde o princípio” (cf. Jo 8,44).

Nós, pois, não nos calaremos diante da injustiça, da difamação, nem da hipocrisia religiosa daqueles que, ousando falar em nome da Igreja, rasgam o véu da caridade com as garras da arrogância. É com espanto, mas não sem lucidez, que reconhecemos nas entrelinhas da referida nota o uso insidioso e calculado de referências homofóbicas, lançadas como punhais contra a dignidade de filhos de Deus que, por sua orientação sexual, tornaram-se alvo de escárnio. Reprovamos com veemência essa linguagem torpe. Não é lícito ferir a dignidade humana sob o pretexto de zelo desgovernado pela doutrina. Assim lembramos-vos, apóstatas da fé: “Maldito quem desviar o direito do estrangeiro, do órfão e da viúva!” (Dt 27,19), e “Com a mesma medida com que medirdes, sereis medidos.” (Lc 6,38)

Tais palavras revelam não a defesa da ortodoxia, mas a deformação de uma doutrina sem amor, um farisaísmo que mata a alma, ainda que preserve a letra. Aos que divulgaram, consentiram ou promoveram esse escárnio, denunciamos em tom profético, como fez Elias contra os sacerdotes de Baal (cf. 1Rs 18), como João Batista contra os adúlteros de Herodes (cf. Mc 6,18), e como Cristo contra os ladrões do Templo (cf. Mt 23). Vosso riso não é o riso do Espírito, mas da carne. Vosso juízo não é justiça, mas vaidade. Vosso zelo não edifica, mas destrói. Vosso coração, endurecido pela idolatria do poder e da estética clerical, perverte a Verdade com veneno e sátira, pois zombais da cruz enquanto portais falsa púrpura.

Nós, ofendidos, perdoamos em nome de Cristo, pois Ele mesmo nos ordenou: "Perdoai setenta vezes sete" (Mt 18,22). Mas perdoamos sem esconder a chaga, pois a caridade não é conivente, e “se alegra com a verdade” (1Cor 13,6). Não respondemos com a mesma moeda, mas elevamos uma palavra firme: os perseguidores serão lembrados, não por sua fidelidade, mas por sua calúnia. Os caluniados, não por sua queda, mas por sua perseverança.

E se fomos feridos por palavras cruéis, respondemos com dignidade. E se nossa fidelidade foi ridicularizada, que o Céu seja testemunha de nossas ações. Pois o Senhor retribuirá a cada um segundo suas obras (cf. Rm 2,6), e a obra dos injustos, hipócritas e tiranos é cercada de maldade, e com maldade serão recompensados.

Erguemos nossa voz não por vingança, mas por justiça e reparação. Não somos santos, mas servimos um Deus que é. E nele confiamos que, se fomos injustamente acusados, Ele nos defenderá; se erramos, Ele nos corrigirá. Aos fiéis, rogamos que não se deixem confundir por vozes travestidas de autoridade que zombam da graça, insultam minorias, e usam da fé como escudo para sua própria amargura e insegurança. Assim disse o Senhor: “Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus”. (Mt 5,10)

Aos perseguidores, advertimos: se não vos arrependerdes, vossas palavras serão vossas testemunhas no dia do juízo. Aos irmãos, permaneçamos unidos, firmes na fé, pacientes na tribulação, alegres na esperança e, sobretudo, inquebrantáveis no amor.


Dado em Roma, nos Apartamentos de São Damião, sob o patrocínio da Bem-Aventurada Virgem Maria, que pisa a cabeça da serpente que semeia discórdia entre os filhos da luz.

VI Jun. MMXXV

+ João Card. Frazen, OSB
Presbítero de Santo Agostinho